23/04/2017 - Midia News
Para Clóvis de Almeida Júnior, discussão agora precisa ser focada em como concluir o novo modal
Alair Ribeiro/Midia News
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Promotor Clóvis de Almeida Júnior, que acompanha o caso do VLT desde meados de 2012
LAURA NABUCO
À frente de uma linha de investigação do Ministério Público Estadual (MPE) sobre as obras do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) desde meados de 2012, o promotor de Justiça Clóvis de Almeida Júnior acredita que, hoje, a grande questão sobre o novo modal de transporte público que deve atender Cuiabá e Várzea Grande é como terminar a obra, e não mais se ela deve ser concluída.
“Já foi gasto R$ 1 bilhão no VLT. Na minha opinião, nós atingimos aquele ponto sem volta. Daqui para frente, a gente precisa terminar”, enfatiza, descartando a viabilidade de uma nova discussão sobre abandonar ou não o empreendimento.
O como terminar, segundo ele, pode ser definido já no próximo mês. Até a primeira quinzena de maio é o prazo que os Ministérios Públicos Estadual e Federal (MPE e MPF) têm para apresentar seus pareceres sobre o acordo que o governo do Estado pretende firmar com o Consórcio VLT Cuiabá para a continuidade e conclusão da obra.
Segundo Clóvis, os apontamentos serão embasados na análise que uma equipe técnica – formada por engenheiros e analistas financeiros, entre outros profissionais – vem fazendo de dados acerca das medições e pagamentos feitos até hoje.
A principal preocupação da Promotoria é de apontar se o valor de R$ 922 milhões, que, segundo o acordo, o Estado terá que pagar ao Consórcio para que a obra seja retomada, é justo ou não e se representa, de fato, a melhor opção para a conclusão do VLT.
Já foi gasto R$ 1 bilhão no VLT. Na minha opinião, nós ultrapassamos aquele ponto sem volta. Daqui para frente, a gente precisa terminar
A alternativa, caso o acordo seja considerado prejudicial aos cofres públicos, é a recomendação por uma nova licitação. Entre os pontos que são avaliados estão o fato já constatado de que o Estado deve ao Consórcio cerca de R$ 300 milhões em obras entregues e não pagas e uma eventual indenização por perda e danos, na hipótese de o contrato ser quebrado.
“Além dos R$ 300 milhões que precisam ser pagos, do que foi medido e feito até agora, tem que entrar nessa equação a responsabilidade do Estado na não entrega da obra. Só isso aí já pode ter um impacto muito maior, que pode inviabilizar uma nova licitação. Mas tudo isso é o que estamos arguindo para os engenheiros. Eles vão espancar essas dúvidas e, a partir da análise do nosso setor de engenharia, é que o promotor pode, com toda clareza do mundo, apontar se esse acordo está protegendo o erário ou não”, diz, ressaltando que o parecer será assinado pelo promotor de Justiça André Luiz de Almeida.
A ação
O acordo a ser firmado entre o governo do Estado e o Consórcio VLT Cuiabá é fruto de uma ação civil pública movida, em 2015, pelo Ministério Público Estadual (MPE), Ministério Público Federal (MPF) e a Procuradoria-Geral do Estado (PGE).
Na época, era pleiteada a suspensão dos prazos do contrato de execução da obra, segundo Clóvis, para uma análise mais clara da situação. A ação, que chegou a resultar em um bloqueio de aproximadamente R$ 300 milhões das empreiteiras que compunham o Consórcio, é a mesma que gerou a determinação da Justiça Federal para que se fizesse uma auditoria na obra.
O principal ponto de entrave era o fato de o Consórcio alegar não ter recebido por trechos já concluídos do modal e apontar culpa do Estado no atraso das obras, enquanto a gestão do então recém-empossado governador Pedro Taques (PSDB) possuía dados que apontavam para um pagamento 25% maior do que as medições, à época, já realizadas no empreendimento.
A auditoria, realizada pela multinacional KPMG, acabou por apontar que 68% da culpa pelo atraso da obra não era do Consórcio, mas do próprio governo, então sob a gestão de Silval Barbosa (PMDB) – hoje preso –, e que o valor de aproximadamente R$ 300 milhões deveria ser pago às empresas e não devolvido por elas.
De acordo com Clovis de Almeida Júnior, é justamente este ponto que pode fazer com que a repactuação do contrato com o Consórcio VLT Cuiabá seja uma melhor alternativa a uma nova licitação da obra.
“A gente sabe que o Consórcio queria mais R$ 1,3 ou R$ 1,4 bilhão para terminar a obra. No final da história, o acordo ficou em R$ 920 milhões. Desses R$ 920 milhões, quase R$ 300 milhões são de medições já feitas e não pagas, então, o que dá de obra mesmo que ainda vai ser realizada é em torno de R$ 600 milhões, um pouco mais que isso”, pontua.
Decisões técnicas
Para o promotor de Justiça, o problema do VLT se iniciou com a escolha do formato da licitação. Uma definição baseada em interesses políticos, em sua avaliação, e não em critérios técnicos.
“O Estado precisa ser profissional. Não tem espaço para amadorismo, para achismo. Ainda mais quando você está tratando de dinheiro público. Essa decisão tem que ser pautada tecnicamente. Em relação ao RDC do VLT, não foi. A decisão foi política”, sustenta.
Mato Grosso foi o primeiro Estado a adotar o Regime Diferenciado de Contratação (RDC) para licitar uma obra. Na época, o modelo havia sido criado exclusivamente para atender as obras destinadas à realização da Copa do Mundo de 2014 no Brasil. O objetivo era acelerar os trâmites burocráticos, afim de que todos os empreendimentos fossem concluído a tempo do Mundial.
O Estado precisa ser profissional. Não tem espaço para amadorismo, para achismo. Ainda mais quando você está tratando de dinheiro público
O problema no caso específico do VLT, de acordo com o promotor, é que se tratava de uma obra nunca antes realizada no país e que seria licitada a partir de um modelo que não permitia uma clara estimativa de gastos e prazos para sua conclusão.
“Em 2012, adotar o RDC como um modal de licitação impedia que a gente projetasse os custos de forma mais adequada. É um mecanismo bom, se for usado da forma correta. O que não dava era, nesse caso concreto, numa espécie de obra que nunca tinha sido realizada no Brasil, que nós não tínhamos experiência, usar, de cara, um RDC integrado – porque ele pode ser parcial – em que você já contrata o projeto e a execução”, explica.
Hoje autorizado para outras obras, o RDC ainda pode e deve ser utilizado, na avaliação de Clóvis de Almeida, desde que a escolha por este modelo seja embasada em uma avaliação da obra a ser licitada.
“Em situações em que você vai ter, por exemplo, uma repetição de obra, onde as alterações vão ser mínimas ou onde você já tem uma experiência de mercado, que te permita aquilatar o gasto e o tempo, ele pode se mostrar adequado, sim. Agora, eu volto a repetir, isso quem diz é o setor de engenharia. Essa definição precisa ser técnica”, ressalta.
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